Eu realmente a amava. Nós nos conhecemos na universidade. Ingressamos no curso de Direito da Universidade Federal do Paraná, em 1985. Ano da morte de Tancredo Neves e do restabelecimento das eleições diretas para a presidência da República. Eu calouro e meu time, o Coritiba, campeão brasileiro de futebol. Ano agitado. Também por causa dela.

Entre o segundo e o terceiro ano do curso, começamos a namorar. Nela, eu gostava de tudo: o som da voz, o perfume do cabelo, o sorriso. Faziamos planos para o futuro. Ela gostava de Direito Comercial e eu também. Casamos dois anos depois de formados. Cerimônia na igreja e recepção dos convidados com jantar no Restaurante Madalosso. Viajamos em lua de mel no dia seguinte, para Florianópolis. Num Corcel 1985.

Hoje, pensando em tudo isso, em todos os detalhes do nosso relacionamento, parece mentira que o casamento tenha durado apenas alguns meses. Dizem que essas coisas acontecem por vários motivos. Acho que não foi esse o caso.

Trabalhavamos em lugares diferentes. Às vezes nos encontravamos para almoçar e o nosso dia a dia seguia uma rotina onde nos sentiamos felizes. Tudo ia bem. Até que numa noite – depois de uns três meses de casados – ela saiu do banho e me repreendeu por eu ter grudado um resto de sabonete num outro sabonete mais novo. Era um hábito que eu tinha, pois me parecia um ato de sustentabilidade. Uma atitude contra o desperdício. Não liguei. Imaginei ser um sintoma de TPM. Continuei a unir os sabonetes e continuamos a brigar por causa deles. Numa dessas discussões, ela ficou bem mais irritada. Teimei. Ela apelou. Disse que eu era sovina como minha mãe. Brigamos feio. Ela me atirou um resto de sabonete e me acertou a testa. Eu perdi a cabeça, juntei o sabonete e o enfiei em sua boca. Ela chorou muito. Eu saí do apartamento na mesma noite. Nós nos separamos. Sem chance de reconciliação.

Que ironia! Nosso casamento arruinado pela minha mania de unir sabonetes. Porque eu não sugeri usarmos apenas shampoo? Continuaríamos limpos e felizes.